quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

Diálogo sobre os dois grandes sistemas do mundo


Imagine que alguém lhe diz que existe algo chamado de "lei da natureza", que faz com que as coisas, misteriosamente, tenham a tendência a ir para o chão. Você nega, usando contra-exemplos: e as nuvens? E a fumaça? A pessoa lhe desafia: ponha qualquer coisa na sua mão e depois solte - a coisa irá cair; e você não pode por uma nuvem na mão.

Então você e a pessoa, fazendo experimentos, podem chegar a um acordo: há dois tipos de coisas, as que caem ao chão, mais densas, e as que flutuam, mais leves. Se vocês quiserem estudar isso, é melhor se concentrar numa delas e esquecer, ao menos por um tempo, a outra. Pedras estão sempre à mão, e nuvens estão um pouco alto, então é mais fácil estudar a queda das pedras.

O estudo da queda dos corpos é fácil de ser feito: basta deixá-los cair e observar o que acontece. É simples deixar as coisas cairem de alturas diferentes e ver se há diferenças em cada queda. Com um pouco de prática vai dar para perceber que quanto mais alto o ponto inicial mais tempo demora a queda, mas não de forma linear. Com engenhosidade dá para se perceber um padrão: a razão entre a altura e o quadrado do tempo de queda parece ser uma constante...

Assim funciona a ciência: observação da natureza, criação de hipóteses, experimentação e, se tudo der certo, formulação de regras gerais. No processo, em geral é necessário simplificar, esquecendo complicações que podem ser abordadas mais tarde. E as nuvens? As nuvens você estuda depois.

Assim a ciência foi feita - e hoje as pessoas têm (ou podem ter se tiverem dinheiro) celulares, internet, TV, antibióticos, anticoncepcionais, e mais um mundo de coisas que veio como subproduto da atividade científica. Infelizmente, pouca gente está consciente de como isso aconteceu e acontece, e poucos sabem distinguir o que é ciência do que não é.

Ciência não é mágica e é distinta da especulação pura e simples: a ciência requer trabalho e coerência lógica (o que a especulação também pode exigir) e requer resultados práticos e comprovações (algo que a especulação pode passar sem). E a ciência é frágil, assumidamente: uma nova explicação pode surgir todo dia, bastando ser melhor do que a usada até então. Melhor em que sentido? Mais simples, mais prática, mais lógica, mais moderna, mais generalizante, melhor em um monte de sentidos possíveis. Não é só por ser nova que uma explicação deve ser aceita: ela deve prever resultados novos em novos experimentos, ou ajudar a reinterpretar os resultados antigos, ou fazer ambas as coisas.

A ciência é uma atividade humana, feita para melhorar - espiritual e materialmente - a vida humana, individual ou coletivamente, e é o melhor que o homem tem para isso. Nada fez tanto pela humanidade, e é difícil vislumbrar algo que venha a fazer tanto quanto ela. Não há mágica: só há o resultado do esforço acumulado de gerações, que pode e deve ser passado adiante. Pena que poucos se dêem conta disso: a maioria das pessoas gosta do que lhes agrada de forma fácil, e prefere ler contos de fadas do que buscar aprender realmente - fogem da matemática da mecânica quântica (pouquíssimos, e quase nenhuma mulher, estudam física a fundo, para saber do que se trata), mas pagam para ficarem encantadas com alguém que lhes diz que a alma é explicada pela mecânica quântica (não é).

(imagem: Galileu, em lembrança de quem se marcou o ano de 2009 como o Ano Internacional da Astronomia, e que estudou a queda dos corpos)

domingo, 15 de fevereiro de 2009

Almas mortas

E para terminar mais um domingo, outro vídeo...



"Someone take these dreams away,
That point me to another day,
A duel of personalities,
That stretch all true realities.

That keep calling me,
They keep calling me,
Keep on calling me,
They keep calling me."

Acho que estou mais perto...

Atom heart mother

Todos os dias de minha vida, se empilhados, um a um, acho que me permitiriam alcançar o céu. As xícaras de café que já tomei, juntas, formariam mares. E os pensamentos todos que eu já tive - oh! - esses certamente forrariam a Terra...

E, no fim, o que eu faço com isso tudo, essas montanhas, mares e planícies? Eu queria apenas acordar, e em cada dia, no café da manhã, ver a voz da chaleira se fundir ao som azul do fogo de meu fogão, como uma lembrança visual de que vale a pena continuar.

Deus, como eu queria saber dizer que há muito mais do que as palavras podem dizer, e que eu estou cheio disso, quase explodindo de delírios e sei-lá-mais-o-quê, um homem-bomba de sensações forçado a viver se escondendo entre burocratas de toda sorte...

Ah! Sei lá o que eu quero dizer! Fica uma música, então, um vídeo para fazer o serviço de que não sou capaz:



Um dia eu vi tudo isso com meus próprios olhos - e ouvidos - e sinto falta, muita falta.

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

The evolving universe


Ontem, este blog completou dois anos. Esta é a postagem de número 199. E eu não acho que nada disso tenha muita importância: na minha frente uma palestrante fala sobre formação de estrelas em grupos compactos de galáxias, dando como um exemplo desses grupos o quinteto de Stephan, um conjunto de galáxias que está em forte interação, e cuja visão, ainda que em cores falsas, é lindíssima...

O universo é muito maior que eu, muito maior que minhas palavras ou minha imaginação e muito, muito, muito, muito mais belo. E nele estrelas novas se formam a cada dia. (Em tempo: minha filha faz sete anos hoje.)

(imagem: uma carinha sorridente...)

terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Um retrato do artista enquanto jovem


Eu nem queria saber voar: só queria é ter coragem de saltar, despreocupadamente, do décimo-primeiro andar...

(imagem: Paisagem com a queda de Ícaro, de Pieter Bruegel, século XVI - você consegue ver onde está Ícaro nessa imagem?)

O princípio da relatividade

Mais um ano, mais um congresso científico... Este até teve umas apresentações interessantes - vou tentar comentar algumas delas aqui, aos poucos.

Um dos assuntos abordados aqui é a natureza do espaço-tempo. Isso mesmo: espaço-tempo (com ou sem hífen após a reforma ortográfica?), que é uma união entre o espaço e o tempo, idéia surgida graças à teoria da relatividade de Albert Einstein. O espaço é o lugar onde as coisas existem e o tempo é... bem, o tempo é o tempo, e os dois - espaço e tempo - parecem coisas bem distintas. Por exemplo, usamos réguas e trenas para medir o espaço e relógios para medir o tempo, ou seja, aparelhos bem diferentes, indicando a distinção que fazemos entre o espaço e o tempo.

Einstein criou a relatividade restrita em 1905, mas quem notou que a teoria dele tinha embutida uma ligação entre o espaço e o tempo foi um ex-professor de Einstein, chamado Hermann Minkowski. Minkowski era um matemático e conhecia algo chamado "teorema de Pitágoras". O que ele viu na teoria de Einstein é que nela havia uma generalização do teorema de Pitágoras, usando quatro dimensões - três de espaço (altura, largura e comprimento) e o tempo...

O teorema de Pitágoras diz simplesmente que há uma relação entre os lados de um triângulo retângulo e sua hipotenusa, ou seja, sabendo o tamanho de dois dos lados de um triângulo retângulo pode-se saber o tamanho do terceiro lado. O que Minkovski notou é que uma relação similar vale para a luz: a distância percorrida por um raio de luz (distância=espaço) está ligada ao tempo que ela leva para percorrer essa distância do mesmo modo que a hipotenusa está ligada aos outros lados do triângulo. E tal relação tem validade universal.

Parece simples, mas é uma idéia com implicações profundas. Minkowski percebeu isso no final de 1908 e tirou as consequências de pronto: "space by itself, and time by itself, are doomed to fade away into mere shadows, and only a kind of union of the two will preserve an independent reality" (o espaço por si só, e o tempo por si só, estão fadados a desaparecer como sombras, e apenas um tipo de união entre os dois irá preservar uma realidade independente).

Einstein generalizou as idéis de Minkowski em 1915, na teoria da relatividade geral. E a nova visão que a humanidade pode ter do universo a partir daí foi - e é - revolucionária, sem falar na beleza (matemática) da coisa... Considero uma pena que a relatividade seja pouco conhecida, pois eu, que sou uma pessoa religiosa (o quê?!), acho a descrição do universo oferecida por ela muito mais bela do que a apresentada por qualquer religião ou mitologia. E uma beleza dessa não é algo de se jogar fora tão facilmente...

(imagem: "ampulheta" - o nome técnico é "cone de luz" - que serve de representação gráfica do espaço-tempo)

sábado, 7 de fevereiro de 2009

Crepúsculo

Hoje, vampiros são atraentes, com as mocinhas aprendendo no cinema que é emocionante se apaixonar por eles, e zumbis são cults, mas nem sempre foi assim. Eu vim de um mundo em que, quando criança, eu tinha pesadelos com vampiros e outras criaturas das trevas, que em meus sonhos me perseguiam para que eu fosse ou como eles ou fosse devorado por eles.



É, muito mudou: hoje vampiros e zumbis estão, entre outros lugares além das telas, nas direções de empresas públicas e privadas e nos governos, e, é claro, na ciência - em cada lugar desses se sobressaem os que não tem alma ou cérebro... Ai de quem não estiver com eles - serão apenas aberrações ou alimento.

Enfim, dava para ilustrar essa postagem com uma música, "We suck young blood", do Radiohead, mas é uma música meio deprê; fica a letra.

"Are you hungry?
are you sick?
are you begging for a break?

are you sweet?
are you fresh?
are you strung up by the wrists?

we want the young blood"

Só por precaução almocei macarrão com um bocado de alho...